A PMPR errou e a justiça corrigiu

AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO JURÍDICO Nº 0017873-36.2012.8.16.0013

AUTOR: SÉRGIO LUIZ LANTMANN

RÉU: ESTADO DO PARANÁ

 

Sérgio Luiz Lantmann ajuizou a presente ação declaratória de nulidade de ato jurídico. Formulou pedido de antecipação dos efeitos da tutela.

Para justificar o pedido de antecipação de tutela, o Autor argumentou que: (1) foi submetido a FATD por ter supostamente enviado um e-mail em que expressou suas opiniões de forma “desrespeitosa e inadequada”, utilizando-se de “modo irônico e torpe”, (…) “para fomentar a indignação e a discórdia entre os Oficiais e Praças da Corporação” sendo-lhe imposta a reprimenda de 5 dias de detenção; (2) não há possibilidade de punição, uma vez que simplesmente exerceu seu direito de livre manifestação do pensamento, garantido legal e constitucionalmente.

Vieram-me os autos conclusos.

O Autor busca a anulação da punição imposta em sede de FATD, sob o argumento de que não poderia ter recebido reprimenda disciplinar por exercer seu direito à livre manifestação do pensamento.

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à liberdade (art. 5º caput da CF).

É livre a manifestação do pensamento, com vedação ao anonimato (art. 5º IV da CF).

A questão foi tratada como um direito e garantia fundamental do indivíduo, verdadeiro tesouro para o exercício da cidadania e preservação da dignidade da pessoa humana (art. 1º I e II da CF).

O legislador constitucional consagrou algo que é da essência de qualquer ser humano, o que seja, o livre pensar. Interpretando a contrário senso, temos como regra geral, a repulsa da sociedade brasileira à implementação de instrumentos de controle e censura da manifestação do pensamento.

Etimologicamente, pensar significa avaliar o peso de alguma coisa. Em sentido amplo, podemos dizer que o pensamento é avaliador da realidade.

Pensar permite aos seres humanos o aperfeiçamento de seu mundo e a modificação de seu destino.

No célebre paralelo traçado por Platão entre realidade, conhecimento e discurso, o pensamento é um dos modos de conhecimento empregado pelo homem (A República). Nesta perpectiva, a alma e não o corpo é o que há de mais precioso para o indivíduo.

Segundo Descartes (1596-1650), “a essência do homem é pensar”. Por isso dizia: “Sou uma coisa que pensa, isto é, que duvida, que afirma, que ignora muitas, que ama, que odeia, que quer e não quer, que também imagina e que sente. Logo quem pensa é consciente de sua existência, “penso, logo existo.” [A liberdade de pensamento – segundo Sampaio Dória – “é o direito de exprimir, por qualquer forma, o que se pense em ciência, religião, arte, ou o que for‟.

Trata-se de liberdade de conteúdo intelectual e supõe o contacto do indivíduo com seus semelhantes, pela qual „o homem tenda, por exemplo, a participar a outros suas crenças, seus conhecimentos, sua concepção do mundo, suas opiniões políticas ou religiosas, seus trabalhos científicos”.

Nesses termos, ela se caracteriza como exteriorização do pensamento no seu sentido mais abrangente. É que, no seu sentido interno, como pura consciência, como pura crença, mera opinião, a liberdade de pensamento é plenamente reconhecida, mas não cria problema maior. Pimenta Bueno já dizia que a „liberdade de pensamento em si mesmo, enquanto o homem não manifesta exteriormente, enquanto o não comunica, está fora de todo poder social, até então é do domínio somente do próprio homem, de sua inteligência e de Deus‟. É Pimenta Bueno que arremata:

“O homem porém não vive concentrado só em seu espírito, não vive isolado, por isso mesmo que por sua natureza é um ente social. Ele tem a viva tendência e necessidade de expressar e trocar suas idéias e opiniões com os outros homens, de cultivar mútuas relações, seria mesmo impossível vedar, porque fora para isso necessário dissolver e proibir a sociedade”.]1

1 José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo. 28ª ed. Editores Malheiros. 2006. Pág. 241

Negar ao homem o direito de pensar, e consequentemente, manifestar livremente o seu pensamento, constitui violência odiosa, só imaginável nos regimes de poder mais cruéis e infames.

Felizmente, a cruedade e a infâmia da restrição ao livre pensamento só não é maior do que a inutilidade e ineficácia da tentativa da restrição, eis que é do espírito humano pensar, é da natureza dos seres vivos ser livre.

Convém lembrar que as organizações sociais, entre elas o Estado, não constituem um fim em si mesmo.

O Estado existe para o homem e não o contrário.

O gênero humano precede todas as formas de organização estatal. As cidades-estado da grécia, a república e o posterior império de Roma, os feudos, os Estados absolutistas, os comunistas, os totalitaristas, os teocráticos fundamentalistas, os ditos democráticos de poder tripartido, todos sem exceção, desapareceram ou desaparecerão antes que o homem deixe de pensar.

Não obstante o que já consignei, é induvidoso que diante dos preceitos excepcionais que norteiam a vida castrense, de sobremaneira a hierarquia e disciplina, é de se admitir certa ressalva à liberdade de expressão dos militares, quando necessária a manter os valores especialíssimos da caserna e a respeitabilidade da instituição perante a sociedade.

O direito à livre manifestação do pensamento, em hipótese alguma, deve ser interpretado como uma “carta branca” ou autorização para o cometimento de ilícitos penais ou administrativos.

O legislador constitucional agiu com sapiência ao vedar o anonimato na divulgação do pensamento, providência indispensável para assegurar a eventual prejudicado o direito de resposta proporcional ao agravo e indenização pelo dano sofrido (art. 5º V da CF). A indispensabilidade de apuração e punição de delitos é decorrência lógica do comando previsto no art. 5º XXXIX da CF.

Não há dúvida que a palavra escrita ou falada pode ser instrumento hábil e eficentíssimo para a prática de ilícitos.

É certo que o excesso agressivo da linguagem não contribui para a harmonia daqueles que vivem e integram o Estado Democrático de Direito denominado República Federativa do Brasil (art. 1o da CF).

Como alertado alhures, nosso Estado Democrático de Direito tem como um dos fundamentos a dignidade da pessoa humana (art. 1o III da CF).

Devemos preservar a dignidade daquele que tem o direito de expressar-se livremente, bem como da pessoa natural ou jurídica que venha a ser ofendida pelo desmando do pensamento exposto. Somente com esta cautela poderemos construir uma sociedade livre, justa e solidária, promovendo o bem de todos (art. 3o I e IV da CF).

É perfeitamente razoável exigir do Estado que não se omita ao ter conhecimento da prática de um ilícito derivado da manifestação do pensamento. Portanto, quando se pretende aferir o comportamento de um militar que, em tese, excede os limites da liberdade de expressão, impõe-se uma análise acuradíssima do caso em concreto.

Nesta análise, a balança de Themis deve operar com precisão absoluta, sendo que a ponderação de princípios deve esclarecer quando haverá prevalência de um em detrimento do outro. Na hipótese em tela, infere-se que o Autor foi submetido a procedimento FATD e punido disciplinarmente após enviar e-mail que, na ótica da administração, utilizou “modo irônico e torpe (…) para fomentar a indignação e a discórdia entre os Oficiais e Praças da Corporação”, expressando suas opiniões de forma “desrespeitosa e inadequada” (evento 1.3 do Projudi, fl. 3).

No caso em comento, é possível reconhecer ao menos três aspectos particulares que vem a corroborar o justo exercício da liberdade de expressão pelo Autor.

O primeiro é o fato de que este emitiu sua opinião em grupo de e-mails, do qual participavam apenas Policiais Militares que visavam discutir diversos aspectos atinentes à corporação.

Neste sentido, destaca-se o depoimento constante à fl. 20, evento 1.4: „‟Que fazia parte de um grupo fechado na internet, que pertencia à Sociedade dos Subtenentes e Sargentos, cujo moderador era o Subten Fogaça (…); (…) Que este grupo de e-mail, saliente-se, um grupo fechado, tinha a finalidade de suscitar o diálogo e a discussão a respeito de vários assuntos, que afetavam diretamente a vida de policiais militares, que depois de discutido tais assuntos, de forma respeitável e regulamentar, vários anseios e preocupações seriam levadas ao conhecimento do escalão superior (…)‟‟.

E ainda, o depoimento de fl. 24: „‟Que quando era Diretor da Sociedade de Subtenentes e Sargentos tinha um grupo de e-mail, criado pela testemunha, do qual era o moderador, para discussões de assuntos de interesse da classe (…)‟‟.

Tal aspecto é relevante porque permite inferir que apenas os militares que acessavam referido grupo de e-mails é que tomaram conhecimento das opiniões emitidas pelo Autor, de modo que suas críticas não ultrapassaram limites interna corporis. Deste modo, não há como se conceber a existência de prejuízo à imagem da corporação perante a sociedade civil.

Portanto, o espaço escolhido pelo Autor para expressar suas críticas parece ser adequado, posto que se tratava de um grupo do qual só participavam militares e que fora criado justamente para discutir aspectos relevantes para a classe, objetivando troca de opiniões e experiências entre os milicianos ali presentes, sendo este o desiderato de um grupo de discussões.

Em segundo lugar, verifica-se que o autor da ação já está na reserva remunerada.

O Advogado do autor foi muito feliz ao invocar os dispositivos da Lei nº 7524/86, que dispõe sobre a manifestação de pensamento e opinião do militar inativo.

Restou patente que o legislador quis dar ao militar da reserva ou reformado um tratamento diferenciado, admitindo que na inatividade, a sua capacidade de arregimentação e influência sobre a tropa é limitado.

A propósito do exercício do direito do pensamento, convém destacar que no Paraná vigora o Decreto Estadual nº 9.192/2010, que veda a instauração de processos administrativos nas hipóteses que especifica. Infere em seu artigo 1º que:

Por este ato, fica vedada a instauração de processos, sindicâncias e quaisquer outros procedimentos análogos, formais ou informais, de natureza disciplinar contra agentes públicos ou empregados da Administração Pública Direta e Indireta do Estado do Paraná em razão do exercício do direito de pensamento, consciência, crença religiosa, convicção filosófica ou política, expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, reunião, associação, protesto, palavra, opinião, voto, crítica, testemunha, representação, denúncia, defesa de direitos, ou contra ilegalidade e abuso de poder, ainda quando eventualmente desfavoráveis a autoridades, sem prejuízo de eventual apuração de responsabilidade na sede judicial.

O Decreto mencionado foi baixado pelo Governador que é o chefe da força militar estadual, nos termos do art. 42 da CF.

Em terceiro lugar, vale lembrar que as críticas exaradas pelo Autor se deram em resposta a um e-mail, à época, atribuído ao Capitão Gustavo, que manifestava opinião desrespeitosa em relação às praças, instigando aqueles que não estivessem satisfeitos com a condição de praça a pedir a baixa da instituição.

Assim, há que se entender que referida posição tenha gerado inconformismo, motivando o autor a expressar-se de modo a defender a categoria das praças, sendo que o e-mail por ele enviado constitui resposta razoável à manifestação anterior. Considere-se, ainda, que o Autor era, ao tempo dos fatos, integrante da AMAI (conforme depoimento de fl. 22, evento 1.4), associação que busca resguardar os direitos dos policiais, sendo compreensível que se encontre engajado na defesa da classe dos milicianos, de modo que não poderia se quedar silente diante de posição afrontosa às praças da PMPR.

Deste modo, é incabível a análise isolada da manifestação do Autor, impondo-se compreendê-la no contexto de “por que” foi emitida e “onde” foi veiculada. O resultado da reflexão permite concluir, ao menos sumariamente, tratar-se de justa e razoável manifestação de pensamento, que não afrontou os princípios castrenses nem tampouco constituiu exercício excessivo de tal direito constitucional. Assim, com as mais sinceras escusas ao nobre e justo Comandante-Geral da PMPR, concluo que a sanção disciplinar imposta ao Autor deve ser suspensa durante o trâmite desta ação.

Não é o caso, no momento, de declarar a nulidade do ato administrativo, o qual, após melhor análise deste juízo, poderá subsistir.

Pelo exposto, em cognição sumária, não exauriente, CONCEDO PARCIALMENTE A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, para o fim de suspender a execução da pena disciplinar imposta ao Subtenente PM/RR Sérgio Luiz Lantmann no FATD 900/2011, até o julgamento definitivo desta ação.

Oficie-se aos órgãos da Administração Militar responsáveis pelo cumprimento da decisão, com encaminhamento de cópia.

Cite-se o Estado do Paraná para que apresente contestação, no prazo legal, sob pena de presumirem-se verdadeiros os fatos alegados na inicial.

Após, dê-se vista ao Ministério Público para manifestação acerca do mérito.

Intime-se o advogado do Autor.

Curitiba, 8 de agosto de 2012.

DAVI PINTO DE ALMEIDA

Juiz de Direito

Fonte: AMAI

PMPR, insulta liberdade de expressão dos Policiais Militares

A PMPR parou no tempo, congelou, estagnou e pensa que vivemos no período ditatorial, é assim que o Comando trata os policiais militares que ousam “pensar”, se “expressar” e denunciar as péssimas condições de trabalho e opressão que vivem. Sociedade civil, acorde! É preciso tratar com direitos humanos para ter direitos humanos, é essa PM que queremos?

Os policiais tem sido perseguidos de forma vergonhosa aqui no Paraná Parado.

Como exemplo, a instauração de IPM pode ser caracterizada como abuso de autoridade, LEI Nº 4.898, DE 9 DE DEZEMBRO DE 1965, pois o Executivo aqui representado pela Polícia Militar não tem poder discricionário para instaurar IPM para pessoa jurídica, no caso da APRA e cercear a liberdade de expressão civil e política dos policiais militares; mesmo porque, o indiciado, injustamente, o Sgt Fontana não se encontrava em situação de serviço.

A sociedade paranaense precisa se opor aos Castelos e homens cravados de estrelas, sem brilho, pois a sua força assim como os capitães do mato estão somente no chicote e no açoite, conhecido como Regulamento Disciplinar.

Comissão Nacional de Direitos Humanos, OAB/PR e Partidos Políticos, isso pode?